A R tem 9 e já faz pequenas tarefas, como ir à mercearia ou à padaria sozinha.
Fica tudo a 2 passos de casa.
Ela gosta de se sentir crescida, destes momentos de autonomia e da confiança que lhe é dada.
Claro que, apesar da curta distância e da conhecida vizinhança, sabe que não deve parar para falar com estranhos. Que mundo este.... Com a idade dela ía sozinha para a escola. Mas isso foi noutro século.
Hoje fez um destes rápidos recados. Quando entrou em casa disse:
"Mamã, estava ali um senhor perto do jardim que deixou cair o pão todo. Eu perguntei se podia ajudar. E apanhei o pão do chão, sacudi um bocadinho a terra e pus no saco. Nem estava muito sujo. Agora estou cheia de pena do senhor...coitado..."
Quando ela começou a conversa fiquei logo mais atenta mal ouvi "estava ali um senhor"..
Perguntei se o senhor era velhinho. Ela disse que sim.
Deve ter percebido porque perguntei aquilo. Passado uns minutos disse:
"Achas que fiz mal em ajudar o senhor?"
Respondi que não.
E fiquei a pensar....Mas que mundo é este em que o simples facto de ajudar alguém pode
estar contaminado com dúvidas e incertezas?!
A R fez bem. Ajudou quando acho que era preciso. Agiu por instinto.
Algo que nos é natural ainda....felizmente!
Mas depois lembrou-se....era um estranho...e hesitou. Ficou a pensar.
E eu? Duvidei também. Mesmo sem ter visto.
Sim, nuns segundos passou-me pela cabeça que um estranho poderia deixar cair o pão do saco para atrair uma criança...
Não gostei deste pensamento. De ter duvidado. De ter sequer hesitado na resposta que dei.
Mas sou mãe.
Tenho medos. Alguns deles novos.
Estou contaminada por demasiadas histórias.
Ficou-me a martelar a frase "Achas que fiz mal em ajudar o senhor?!"....
Mas pior de tudo foi o ter respondido que não mas ter ficado a pensar num "e se?"...
Que mundo este...que nos transforma, que nos perturba os instintos naturais de ser humano e de ser.
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