quinta-feira, 9 de abril de 2015
Era...
A Páscoa dos meus tempos era a época das limpezas de Primavera.
Daquelas em que se arrastavam móveis e até se lavavam os tetos!
Não se comia carne às sextas feiras durante a quaresma. Às vezes só me lembrava disso à noite depois de na escola já ter comido um croissant com fiambre. Deus já me deve ter perdoado.
Escolhiam-se roupas novas para estrear no Domingo.
Era cor.
O branco das paredes lavadas ou pintadas de fresco.
O vermelho das opas no compasso, por vezes num desbotado que parecia rosa.
Os verdes à porta de casa, salpicado pelo rosa escuro das camélias.
O pão de ló amarelo, graças às gemas caseiras.
O lilás das glicínias.
O rosa das amêndoas de açucar.
O roxo dos amores perfeitos e das ervilhas de cheiro.
As primeiras roupas coloridas depois de um inverno cinzento.
Era cheiro.
O ar fresco das casas.
A mesa posta.
O perfume das flores.
Era som.
Os foguetes anunciavam a saída da cruz da igreja.
O som da campainha que anunciava o compasso.
O burburinho das conversas sobre o tempo que demora a cruz, sobre onde já passou e a que casa irá a seguir.
As solas dos sapatos novos escada acima.
O "Aleluia Aleluia" acompanhado da benção.
Era tradição.
Havia a espera.
O beijar da cruz.
O cumprimentar os elementos do compasso com um aperto de mão.
O último senhor levava um saco de tecido vermelho, atado por um cordão.
Se na casa havia crianças deixava meia dúzia de amêndoas no branco imaculado da toalha bordada.
Depois de beijar a cruz na casa de uns avós, rumávamos a casa dos outros avós, pela Estrada Nacional.
Por todo o caminho íamos comentando "Aqui já passou", "Aqui ainda estão à espera".
Por todo o caminho havia verdes no chão e o tlim tlim tlim tlim que me ficou gravado na memória.
Na maioria das vezes chegávamos quase ao mesmo tempo que o compasso.
Outras, só mesmo a tempo do pão de ló com azeitonas e do espumante.
Era...
Não é que não o seja ainda.
Mas é cada vez menos.
Domingo, o da Páscoa, ficaram a faltar algumas cores, cheiros, sons e tradições.
Mas tivemos a toalha branca bordada, as glicínias e o pão de ló, não tão bonito por fora, nem feito com ovos caseiros, mas muito saboroso!
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